quinta-feira, 29 de maio de 2014

Se um dia eu passar pelo passado, vou estudar bem fundo todas as escolhas perdidas, afinal as achadas já estou letrado e mestrado. 
Cavocar os buracos sem busca, esmirrar aquelas vontades esquecidas.
Ficar sentadinho por alguns momentos, observando quando achei estar falando de rosas.
E ai, depois pego uma carona rapidinho para ir lá na frente, só para ver o resultado da pesquisa.
E enquanto o ônibus para o presente não chega, vou rodar por ai, conhecer alguns bares, amores perdidos, desencontros, possibilidades inexistentes...
Chegando em casa, vou deitar na rede esperar a visita da amiga tarde, não pensarei em nada.
Depois, devagarzinho deixo Cartola me tocar a alma (que jamais foi vazia, nem lá, nem cá e nem acolá), " A sorrir / Eu pretendo levar a vida / Pois chorando / Eu vi a mocidade / Perdida..."
Naquela noite de calçadas cinzas, a pequena sentou, fitou a rua e a lua.
Lembrou das flores e da formiga no jardim. 
Lembrou que não sabia dizer meias-verdades, muitos menos verdades inteiras
Para isso, seria preciso conhecer a mentira...
Mas seria um erro, pois também lembrou que na sua vida, essa palavra não existia...
Depois de um tempo levantou-se, bateu com a mão no vestido, olhou a poça e reparou que a lua dormia. Era só isso que a pequena sabia.

terça-feira, 27 de maio de 2014

Conto um sonho

Éramos quatro amigos andando e conversando.
Foi quando o nego atravessou o meu caminho e me chamou de jeito peculiar.
Foi quase uma benção, mas estava mais para um toque. Ele sabia que eu iria revidar.
Nego, mandingueiro, me conhecia.
E assim foi, dei a resposta; uma meia lua de compasso.
Ele riu com aqueles dentes brancos como o seu chapeuzinho na cabeça.
Esse nego todo vestido de preto, apenas os dentes, chapéu e sapatos brancos.
Sorrindo me chamou para a vadiagem e todos os outros brancos ao redor, não entendiam.
A briga daquele moleque com o preto-velho.
Eles brigavam sorrindo, eles brigavam brincando...
Pois não era briga não gente, era o jeito daquele nego/sábio, passar o recado ao moleque.
E assim se sucedeu; na base das pernadas.
Foi rabo de arraia pra cá, esquiva pra lá  e cabeçada acolá.
Aquele nego era Mestre, era preto-velho, era mandingueiro que sabia samba.
E daquela forma, na roda veio me salvar.
Foi logo à frente, onde meus amigos continuavam a andar, pois não pararam para ver eu e o nego jogar.
Foi lá na frente que escutei o grito. Parei de brincar.
Eram só alguns metros, muito sangue derramado no asfalto, três corpos ao chão.
Dois mortos e um com a perna arrancada, coisa feia pra mostrar.
Foi um fio de aço arrebentado que acabou com a vida, passou mais rápido que uma queixada.
Eu era para estar ali no chão, mas o nego na capoeira fez eu cessar.
O nego faceiro me parou. O mandingueiro me salvou.
Era um preto-velho, vestido de negro, chapéu e sorriso branco.
Cadê ele, cadê esse nego? 
Não sei, sumiu da mesma forma que entrou; sorrindo.
Foi tudo um sonho, mas no sonho fiquei vivo.
Na minha memória ficou gravado seu rosto faceiro.
Reconheço-o, já o vi na vida.
Uma vez, lá na parede da Bahia, seu retrato em preto e branco.
Era antepassado dos Mestres de hoje em dia.

Axé nego velho, tu me salvaste com a roda da vida.
Pena que a poesia não salva tudo, na verdade ela não salva nada.
Poesia são sonhos em letras, feita por sonhadores. 
E esses voam, as nuvens são suas casas, mas quando pisam no chão tomam flechadas e as flechas machucam, fazem cicatrizes e doem.
Quero ver você dar o pão a fome.
Quero ver você dar a cura a doença.
Quero ver você dar o perdão ao arrependido.
Quero ver você salvar a vitima do assassino.
Quero ver você me livrar da amizade perdida...
Não poesia, você não pode nada disso, aqui é terra, é chão e as leis são outras.
É ferro, brasa, ação e fato, sem espaço e abertura para fracassos.
O julgamento está pronto e a sentença não brinca.
Com a realidade da vida você não comunica.
Desculpe minha amiga "Poesia" aqui me despeço...
Pois a fé em tu, ficou despida.

sábado, 17 de maio de 2014

Eu não consigo escrever em papeis bonitinhos.
Minha poesia vem dos guardanapos, das folhas rasgadas,
dos lenços chorados.
Vem de papelão usado.


... Estou aqui, tentando pescar as palavras perdidas.
Nessa selva, chamado vida.